A ponte de Rio Mourinho
A ponte é
atribuída a um engenheiro militar que executava as obras com a ajuda do sogro.
Eram suspeitos de não respeitar a regra de concurso público e escolha de
propostas mais vantajosas para o erário público.
A seca no Vale do Sado pôs a descoberto uma
ponte há muito submersa pelas águas da albufeira do Pego do Altar, na zona de
Rio Mourinho, Santa Susana, em local que era passagem “obrigatória” nos
roteiros das viagens entre Lisboa e Beja durante o século XIX. Popularmente conhecida
como “romana” ou até “românica”, a ponte será, quanto muito, romântica para
quem ali queira namorar, aproveitando a secura que se espera seja saciada pelas
chuvas do próximo Inverno. O projeto, oitocentista, é atribuído a António
Elizeu Paula de Bulhões, mas o autor pode não ser este engenheiro militar com
ligações familiares ao Torrão.
António Elizeu Paula de Bulhões, filho de um
religioso, médico do Santo Ofício, andou, de facto, pelos concelhos de Alcácer
do Sal e do Torrão, mas está por provar que seja o autor da ponte barroca de
Rio Mourinho. É que o projeto conhecido (ver imagem) nada tem a ver com o que
foi construído: dos materiais, aos vãos (arcos) - que no esboço são apenas dois
e na verdade são oito, mais sete grandes orifícios e gárgulas para escoar a
água da chuva, que não constam do “desenho”, datado de 1817. A solução final,
mais económica e fácil de executar, é, por isso, uma adaptação do próprio à
realidade do local, ou pertence a outrem.
Certo, certo é que, em 1821, este engenheiro
andava com o seu sogro, João Jácomo da Lança Cançado, a reparar as pontes de
Palma e sobre o rio Xarrama, ambas no atual concelho de Alcácer do Sal, bem
como a estrada “que vai de Beja a Porto Rei”. Acontece que as obras eram
executadas sem obedecer à regra de “arrematação” - algo comparável aos
concursos públicos dos dias de hoje. Assim sendo, podia ler-se em Diário da
Regência, eram escolhidos “os preços de forma arbitrária” e “nem sempre os mais
cómodos”, para a “Fazenda Nacional”, algo que devia ser “imediatamente cessado
e punido”.
Apesar da crítica, António Elizeu continuou ao
serviço da Coroa - militar do Real Corpo de Engenheiros e também Inspetor dos
Incêndios - sendo curioso saber que o seu sogro e colaborador nas obras era, à
época, primeiro vereador da então câmara do Torrão – sem dúvida, uma
promiscuidade já então censurável.
Sabemos ainda que esta associação perdurou,
porque, já em 1829, a Gazeta de Lisboa conta que os dois homens, referidos como
“deputados pela câmara do Torrão”, vão juntos manifestar a sua devoção e
fidelidade a D. Miguel.
António Elizeu teve, aliás, oportunidade de
provar a lealdade jurada, pois tomou parte pelo lado dos absolutistas na guerra
civil que tão má memória deixou ao país.
Tal como havia acontecido durante as invasões
francesas, em que lutou, foi preso e recusou todas as pressões para se passar
para as hostes do inimigo, manteve-se firme entre os defensores de D. Miguel.
Com a derrota dos princípios que defendia,
afastou-se da vida pública e viria a morrer em Lisboa, a 28 de fevereiro de
1844. Teve pelo menos um filho com dona D. Maria Benedicta Lobo do Macedo
Vieira: Miguel Eduardo Lobo Bulhões, jornalista de renome.
António Elizeu Paula de Bulhões foi incumbido
por D. João VI de conceber uma planta para a construção de uma ponte sobre a
ribeira de S. Marcos [da Serra], no concelho de Silves, na estrada de
comunicação entre a província do Alentejo e reino do Algarve pela serra do
Caldeirão, bem como averiguar as condições da estrada entre este local e a já
então projetada passagem na freguesia de Santa Clara e ainda outra ponte na
freguesia de S. Martinho, prevenindo as cheias do rio Odemira. Em todos os
casos foi advertido que deveria “por em praça para arrematar” a execução dos
trabalhos e velar para que se escolhesse o local, os meios e o projeto que
menos despesa representasse ao erário público. Corria o mês de junho de 1821,
Mas isso é outra história
Créditos : Photography Digital
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