POSTAL DO DIA
A deputada que é uma “aberração” e “parece morta”
1.
Ana Sofia Antunes detesta quando alguém
a trata por invisual.
Sou mesmo cega, costuma dizer.
No seu caso cega de nascença. Não houve
um único segundo em que tivesse visto o mundo como nós o vemos, mas sempre o
“viu” melhor do que nós com todos os outros sentidos.
2.
Ana Sofia é a “aberração” e a que
“parece morta” para a bancada do Chega.
Ela ouve muito bem, distingue as vozes
na perfeição e escutou nitidamente o que preferia não ter ouvido.
Tantas vezes lhe aconteceu isso. Ouvir
falarem sobre si, ouvir os que a tratavam por
“Ceguinha”.
Ou por
“Coitadinha”
Ou por
“Feinha”
3.
Nasceu cega.
Cresceu insegura, mas com o tempo soube
arranjar forma de fazer as coisas, de fintar os problemas, as paixões não
concretizadas, o medo de a acharem incapaz, o receio de ser horrível aos olhos
dos outros, a impossibilidade de ver as pessoas, os lugares, os filmes, os pais
e amigos.
Só que a Ana Sofia desejou sempre
escalar ao topo da montanha. Quis sempre estudar, saber mais, fazer perguntas e
orgulhar os pais.
Um dia serei um orgulho para ti…
… imagino que o tenha dito à mãe que era
das montanhas, da aldeia do Picadouro, na freguesia de Pombeiro da Beira,
concelho de Arganil.
Aposto que a mãe lhe contava dos rios e
dos montes da sua própria infância, o Alva e o Sarzedo, a ponte de pedra, o
caminho para Coimbra.
4.
Ana Sofia licenciou-se em Direito na
Faculdade de Lisboa.
Esforçou-se para não ficar para trás e
não ficou para trás.
Formou-se e muito jovem liderou os cegos
em Portugal, ela era a mulher capaz de mover mundos e fundos para resolver os
problemas na ACAPO.
António Costa conheceu-a e não hesitou em
convidá-la para secretária de Estado. E já como deputada fez amigos em todas as
bancadas.
Gosta de abraçar, de ser afetiva, de
falar na Clarinha, a sua filha com quase dez anos a quem vê com as mãos.
5.
A Clarinha que gosta de ouvir o
telejornal e não perde nenhuma entrevista da mãe.
A Clara a quem os colegas da primária
perguntaram se estava tudo bem na manhã seguinte aos insultos que a sua mãe
sofreu no parlamento.
Querida Clara, se te voltarem a perguntar,
se aquilo tornar a acontecer, diz-lhes que estás melhor do que antes e que a
tua mãe está muito mais bem-disposta do que no dia anterior.
É que não há melhor elogio do que ser
insultado por gente tão sombria, tão horrível e tão deficiente no caráter, na
empatia e na bondade.
Ser insultado pelo “mal” é um motivo de
satisfação e a prova de que se está no lado oposto da barricada. Não há melhor
satisfação do que essa.
LO
Fonte: https://www.facebook.com/luis.osorio.940
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